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quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Entrevista com Marcelo Lemos Dornelles


Entrevista com Marcelo Lemos Dornelles 

(24/07/2012)


 Marcelo Lemos Dornelles, Subprocurador-Geral de Justiça do MP/RS e Presidente do Instituto Crack Nem Pensar,  concedeu entrevista para o boletim da Abead e avalia a atual situação das drogas no Brasil. Confira na íntegra:

  


Como você avalia a situação do consumo de drogas no país? E na região onde vocês atuam especificamente?

O consumo de drogas lícitas e ilícitas vem aumentando em todo o país e também na região sul. Após mobilização social e de autoridades conseguimos aumentar o número de apreensões de drogas e aumentaram muito as prisões por tráfico, reduzindo a oferta de drogas. Aumentaram o número de leitos psiquiátricos para atendimento e internação. Agora estamos focados em melhorar a prevenção.

O que tem achado das ações criadas pelo Governo para combater essas substâncias, especialmente o Crack?

O plano do governo federal teoricamente é muito bom! Pela primeira vez há uma boa compreensão do problema, que é multidisciplinar, que não pode ser abordado de forma preconceituosa e nem conservadora. Por outro lado, ele envolve os Estados, Municípios e especialmente a sociedade. Sem esse envolvimento nenhum plano vai dar certo. Há previsão de grandes recursos financeiros para sua execução. O único problema que vejo é ele não ser executado, assim como outros que ficaram no papel. O problema é de execução. Se isso ocorrer, a situação tende a melhorar bastante.

Uma variante mais perigosa do Crack, o Oxi, tem ganhado destaque na imprensa nos últimos tempos por conta de sua rápida chegada e disseminação no Brasil. Porque ele alcançou uma enorme quantidade de usuários com tanta facilidade?

O Oxi vem entrando no Brasil e depois vai vir outra droga. O foco tem que ser o mesmo, independente da droga do momento. A diferença é a dependência que é mais rápida com essas drogas. O tripé redução da oferta, atendimento de saúde e prevenção tem que ser intensificado. Cada novo dependente cria um custo social muito grande. É muito difícil reinseri-lo na sociedade. Essas drogas deixam sequelas muitas vezes irreversíveis. Elas se propagam inicialmente nas pessoas que estão alheias a programas sociais, que estão nas ruas. A população de rua deve ser atendida de forma prioritária, são vulneráveis.

Quais as ações que o instituto tem feito para ajudar no combate às drogas?

Nosso foco prioritário é a prevenção e o debate técnico do tema. A repressão e as políticas públicas de saúde e de segurança são dever do poder público. Nós cobramos providências, mas focamos na prevenção. Queremos dialogar com o público jovem, de forma direta, clara, sem mentiras e exageros. Nossa proposta é falar antes, dar informações qualificadas e seguras antes que "outros" o façam. Esses outros são os colegas, vizinhos, que vão iniciar os outros jovens no uso de drogas.
Estamos desenvolvendo parceria com a Secretária de Justiça e Direitos Humanos do Estado para diversas atividades, como: teatro juvenil, festival de música, gincana digital, revista infantil, concurso de monografia sobre o tema, concurso de redação, tudo buscando uma linguagem que aproxime a comunicação com esse público.

Na sua visão, a internação compulsória é uma boa alternativa?

Em alguns casos é imprescindível, mas deve ter recomendação médica. O dependente de crack muitas vezes entra em surto e a própria abstinência pode levar a isso. Ele precisa ser medicado no início e, por vezes, a internação é indispensável. Deve ser criteriosa, por um prazo em torno de 15 a 30 dias, conforme o caso, e depois deve haver acompanhamento muito próximo da família e dos profissionais de saúde. As recaídas são muito frequentes.

A expectativa para os próximos anos é que o numero de dependentes químicos continue crescendo, ou há alguma previsão de queda nesse índice?

Com um bom programa de prevenção, envolvendo muito a sociedade, as escolas, as grandes mídias e as mídias sociais, podemos diminuir o consumo e por consequência o número de dependentes. Hoje já há uma melhor preparação para atender os dependentes. Minha preocupação principal são os debates sobre a liberação da maconha no Brasil e no Uruguai. A visão de alguns juristas, que é limitada a questão da liberdade e da punição, não percebe que as drogas lícitas, como álcool e cigarro, e depois a maconha, são porta de entrada para todas as outras drogas mais pesadas. Da mesma forma, não sabem que as drogas em que há abuso são as lícitas e que aumentando a oferta, aumentará o número de usuários e de dependentes. Essa discussão não ajuda nada na prevenção. O Brasil não tem nenhuma tradição em respeitar o direito administrativo, como exemplo as questões de trânsito e de improbidade administrativa. Aqui confunde-se o proibido com o crime. Se não é crime, é permitido.


Fonte: ABEAD - Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas



Amor é enigma!


Amor é enigma!


Optar é renunciar. Entregar-se, por exemplo, a um amor é abandonar outros. E, do que se renuncia e abandona, pode provir, depois arrependimento. Afastar-se de um amor, ainda que, opção feita por lúcidas razões, pode gerar, adiante, a frustração pelo que se deixou de viver.

Os casos de amor vivem rondados por frustração ou arrependimento. Não o amor, que é íntegro, irrefutável, cristalino e indubitável: mas os amantes seus portadores. Quase sempre o tamanho do amor é maior que o dos amantes.

O que cerca as pessoas que se amam é sempre uma teia de limitações que o leva à disjuntiva: frustração ou arrependimento. Ou quem ama se entrega ao sentimento e se atira nos braços do outro para, depois, se arrepender do que abandonou para entregar-se ao amor, ou se afasta, cheio de lucidez, para, adiante, sentir frustração pelo que deixou de viver.

Estes estão na categoria assim definida de modo cruel mas lúcido por Goethe: "no amor, ganha quem foge...Ou como disse o grande Orizon Carneiro Muniz: "no amor, é mais forte quem cede".

Na juventude tudo isso fica confuso porque esta é uma etapa da vida envolta em uma névoa amorosa que a torna radical na busca da felicidade.

O jovem ainda não se defrontou com as terríveis e dilacerantes divisões internas de que é feita a tarefa de viver e amar, aceitando as próprias limitações, confusões, os caminhos paralelos e contraditórios das escolhas, dentro de um todo que, para se harmonizar, precisa viver as divisões, os sofrimentos e os açoites das mentiras e enganos que conduzem as nossas verdades mais profundas.

Séculos de repressão do corpo e de identificação do prazer com o pecado ou o proibido fizeram uma espécie de cárie na alma.

É um buraco, um vazio, uma impossibilidade viver o que se quer, uma certeza antecipada de que o amor verdadeiro gera ou arrependimento ou frustração.

Viver implica, pois, aceitar essa dolorosa e desafiante tarefa: a de enfrentar o amor como a maior das maravilhas e que se nos apresenta sob a forma de enigma.

Tudo o que se move dentro do amor está carregado de enigmas. E com o enigma dá-se o seguinte: enfrentá-lo não é resolvê-lo. Mas quando não se o enfrenta, ele (enigma) nos devora.

Enfrentar o enigma mesmo sem o deslindar, é aquecer e encantar a vida, é aprender a viver; é amadurecer. Exige trabalho interior penoso, grandeza, equilíbrio e auto-conhecimento.

O contrário não é viver: é durar.

 Artur da Távola


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Entrevista: Ronaldo Laranjeira

Um dos principais especialistas em dependência química no Brasil fala ao Infosurhoy.com sobre como combater as drogas no país.
Por Cristine Pires para Infosurhoy.com – 20/07/2012

Sobre o site Infosurhoy.com
InfoSurHoy.com é uma fonte abrangente de notícias e informações sobre, e para, a América Latina e o Caribe, patrocinado pelo Comando do Sul dos EUA (USSOUTHCOM). O objetivo do InfoSurHoy.com é oferecer uma cobertura precisa, imparcial e de vanguarda sobre os acontecimentos na região.
O site apresenta notícias de toda a região, além de análises, entrevistas e comentários de correspondentes e colaboradores pagos pelo InfoSurHoy.com.
 






“O Brasil precisa enfrentar esta enorme rede de distribuição que, combinada com o preço baixo da cocaína e do crack, fruto do fato de termos vizinhos produtores, alimenta a pandemia [de drogas]”, diz o psiquiatra Ronaldo Laranjeira. (Guilherme Gomes para Infosurhoy.com)
 

PORTO ALEGRE, Brasil – Para vencer a luta contra as drogas, o Brasil tem investido bilhões de reais em iniciativas para prevenção e tratamento aos dependentes químicos no país.

O foco central é o crack, considerado por autoridades e especialistas um grave problema de segurança e de saúde pública.

Entre as medidas adotadas pelo governo brasileiro está o Plano Nacional de Combate ao Crack, lançado em 2011 e que prevê investimentos de cerca de R$ 4 bilhões em ações de enfrentamento ao crack até 2014.

A meta é que os recursos sejam aplicados em prevenção, tratamento e repressão ao crime organizado.

Para o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, um dos fundadores da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (UNIAD), é preciso atualizar as políticas públicas nacionais voltadas ao tratamento e prevenção do uso de crack e outras drogas.

Em funcionamento desde 1994, a UNIAD é um centro de excelência em ensino, pesquisa, prevenção e tratamento do uso indevido de álcool, tabaco e outras drogas.







“O primeiro passo é criar uma gestão diplomática entre os países vizinhos para reduzir a produção de drogas”, afirma Laranjeira, que também é professor titular do Departamento de Psiquiatria da Unifesp, diretor do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas do Álcool e outras Drogas (INPAD) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).


Considerado um dos principais especialistas em dependência química do Brasil, Laranjeira falou com exclusividade ao Inforsuhoy.com sobre a importância de envolver todo o país na luta contra a pandemia de crack.

Infosurhoy
: Qual a sua avaliação sobre o Plano Nacional de Combate ao Crack?

Laranjeira
: Na verdade, o Brasil ainda não se deu conta da gravidade da situação. Tanto que não temos uma gestão diplomática no sentido de diminuir a produção de drogas nos países vizinhos. O Brasil faz fronteira com os maiores produtores de cocaína: Bolívia, Peru e Colômbia. Cerca de 80% da cocaína consumida no país vem da Bolívia, onde a produção continua crescendo. Reduzir a produção nesses países é fundamental..

Infosurhoy: O caminho de entrada da droga no país é praticamente o mesmo ao longo da última década. Por que então o problema se agravou?

Laranjeira: Nos últimos 10 anos, o Brasil registrou um aumento estrondoso no número de pontos de vendas de drogas. Há uma década, o fenômeno estava restrito às grandes cidades. Hoje, verificamos isso de norte a sul, leste a oeste. Todos os municípios brasileiros estão infestados com pontos de tráfico. O Brasil precisa enfrentar esta enorme rede de distribuição que, combinada com o preço baixo da cocaína e do crack, fruto do fato de termos vizinhos produtores, alimenta a pandemia que temos. Se não fizermos uma política rigorosa de conter importação e a rede distribuição, os problemas vão continuar.

Infosurhoy: Mas o sistema de tratamento é eficaz?

Laranjeira: Não adianta ter apenas um sistema de tratamento para diminuir o consumo de crack. Não podemos contar com um monte de boas intenções genéricas. Desde que o governo federal anunciou o plano, em 2010, até agora, pouca coisa mudou. Muitos estados ainda não receberam as verbas prometidas. É preciso levar em conta o aspecto macro do problema: produção, distribuição e baixo preço.

Infosurhoy: Qual sua sugestão então?

Laranjeira : O Brasil tem que definir estratégias para lidar com esses problemas. Os consultórios de rua também não apresentaram eficácia. Quantas pessoas foram tiradas da rua por essa sistemática? Não se tem um número nem mesmo uma avaliação da efetividade dos consultórios de rua. Outro ponto que precisa ser revisto é o fato de o governo defender que as internações dos dependentes químicos sejam feitas em hospitais gerais. Acho isso um absurdo. A maioria dos hospitais não vai querer receber um usuário de crack, e leitos isolados também não vão adiantar. Precisamos ter hospitais especializados.

Infosurhoy: E como trabalhar na prevenção?

Laranjeira: O Brasil teria que criar uma rede de prevenção mais efetiva, com um programa que ainda não temos, voltado principalmente aos grupos de risco. E, quanto a grupos de risco, me refiro a adolescentes que abandonam escola, vão mal nos estudos ou começaram a experimentar drogas. A maioria dos usuários de drogas, cerca de 90%, começa a experimentar na adolescência.

Infosurhoy: A estratégia da redução de danos é uma alternativa?

Laranjeira: A redução de danos consiste em oferecer uma outra droga, teoricamente menos prejudicial, com o objetivo de evitar a abstinência. Alguns países que adotaram esse sistema abandonaram a metodologia nos últimos dois anos. Na Inglaterra, por exemplo, eles descobriram que a eficácia da redução de danos foi de apenas 4%. Quando eles viram que investiram milhões e tinha dado um retorno tão baixo para sociedade, abandonaram o conceito e agora a abstinência é o foco do tratamento. Então, no caso do crack, sou desfavorável à proposta do Ministério da Saúde de fazer tratamento baseado em redução de danos como única alternativa.

Infosurhoy: Qual a alternativa então?

Laranjeira: Nas casas assistidas, programa em São Paulo, os dependentes químicos não podem usar drogas. Além da moradia, eles têm direito a todo o tratamento, mas para ter direito a tudo isso é preciso que fiquem abstinentes. Se em uma casa dessas há 10 usuários e um deles usa a droga, é mais provável que aquele que recaiu leve os outros 9 com ele. Isso mostra o drama que é o uso do crack.

Infosurhoy: Mas então é possível recuperar usuários?

Laranjeira : Certamente. O Ministério da Saúde precisa oferecer uma estrutura de tratamento via clínicas de internação. O Sistema Único de Saúde (SUS) não tem esse nível assistencial. Por enquanto, só quem tem dinheiro procura uma clínica de qualidade. O Ministério da Saúde precisa ter a visão do que realmente funciona no sistema de tratamento e abandonar técnicas ultrapassadas. Além da falta de experiência conceitual, a burocracia impede o dinheiro do programa de chegar aos locais que necessitam dessas verbas.